Cada vez que você ia embora, um pedaço de solo por onde eu
caminhava caía bem abaixo dos meus pés. Isso me obrigava a dar um passo à
frente, procurando solo firme para continuar.
A lua rotacionava ao longo da madrugada, do lado direito ao esquerdo da minha janela. Alguns dias, bem visível; alguns dias, invisível, mas sempre rotacionando, assim como aquele ponteiro menor. As horas iam morrendo ao longo da madrugada, eu vivia os seus segundos sentindo àquelas coisas inomináveis. Pela manhã, tentei nomeá-las no caminho do consultório, endereçando à minha amável analista. Treinei falar: nas noites, sinto “oco”, “abandono”, “vazio”, “medo”, “temor”, “inadequação”, “desespero”, “abandono”, “isolamento”. Quando ela abre a porta, pontualmente às 9h30, abandono todas as palavras ocas e inadequadas, desesperada pelo temor de que minha analista me abandone frustrada por eu não me curar jamais da minha melancólica repetição. Deixo isso para lá e relato as preocupações vazias de um cotidiano conturbado de episódios maníacos, onde sou explosiva – no intervalo das 8h às 22h. Após o dia, às 23h, retorno ao isolamento, junto à lua, com medo da noite que morre.
Encontro-me às vezes Com um sorriso no canto dos lábios Encorajando-me a seguir em frente E te deixando um pouco de lado. Não assimilo o que tem Nesse teu jeito inconveniente De deixar sempre presente A ironia e o sarcasmo Que irrita tanta gente Mas me deixa irresistivelmente contente E me faz desejar saber o que há Por trás da jaqueta de couro E do seu cabelo desarrumado O que tem aí por dentro Se um anjo machucado Ou o diabo reencarnado. Você é perigoso Anda sempre com um cigarro no bolso Tem um jeito indelicado E uma tatuagem no pescoço. O que é que você tem Que me deixa sem resposta? Faz-me entender, te peço, Por todas as vezes que ajoelho e rezo Para não ficar sempre tão nervosa. Talvez seja tudo um drama grande Essa minha necessidade de te ter um pouco Porém quem dera te ter como amante Por uma vida inteira ou um instante. Faz-me entender, te peço, Esse desejo extremamente louco Preciso aprender que é apenas um...
Houve uma música Nas cordas do violão Nas cordas vocais. E pela primeira vez, Fez-se primavera. Apenas aquela música existiu. Em seu calmo e belo tom Fez-me adormecer, Aquela canção que você cantou, Canção de ninar feita para mim. Só a tua voz eu queria, Só teu bondoso jeito, Teu ar delicado, Só você: doce, doce. De lagarta à borboleta, Tornava-me agradável Ao te ter por perto. Tua voz era o vento do qual me fazia voar Leve, tão leve eu ficava, Quase podia flutuar. Perdi-te antes do sol aparecer E minha vida tornou-se uma grande busca Pela voz que por tantas vezes Fez-me adormecer. Procuro-te na noite, no ar, Em qualquer som que puder me tocar. Tua melodia que entrou em meus ouvidos E foi direto ao coração. Oh menino, oh, Vem de novo me acalmar.
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