Emília - parte I.

     Emília amanheceu antes do sol, com olhos inchados pela noite anterior. Esperou os primeiros raios adentrarem pela janela, observando com um olhar sereno. Pensava: sem dramas, ainda há um mundo imenso fora daqui. As luzes do sol iluminavam o quarto deixando-o com um tom alaranjado. A menininha colocou os pés para fora da cama até os mesmos alcançarem o chão, caminhou até o guarda-roupa e vestiu seu casaco cinza, calçando, posteriormente, o sapato que havia separado. Foi até o baú envelhecido que ficava no canto do quarto, abriu lentamente e juntou as cartas e fotografias antigas que estavam ali, apertando-as junto ao peito, fechando fortemente os olhos por alguns segundos. Faltam apenas alguns minutos, aguenta, por favor, pensou. Andava em silêncio pelo quarto para não acordar John, que dormia no lado direito da cama. Após guardar as lembranças em sua bolsa, abriu com cuidado a porta e olhou com piedade para o homem que dormia em sua cama, com um ar despreocupado e cheiro de bebida. Homem esse que tanto a fez chorar. Olhando-o, sussurrou: adeus, John. Ela estava deixando sua casa para procurar seu lar. Desceu as escadas em ponta de pés, como se estivessem enfestada de vidros. E, por fim, partiu. E dessa vez ela não voltaria.

 
     Pela primeira vez em tanto tempo, respirou e pôde sentir o ar. Sentiu a liberdade e a calma, ouviu o canto dos pássaros e sorriu ao ver o azul do céu. Não queria se atrasar, mas andava sem pressa. Com pequenos passos, chegou à rodoviária da cidade, onde Thomas a esperava com sorriso no rosto e malas na mão. Procurou pela multidão o olhar daquele que tanto a esperou. Altos, baixos, loiros, morenos, havia tanta gente ali, ninguém era ele.
      Andava esperançosa pela rodoviária, com rosto angelical, expressando a paz que a cercava. Corria o olhar por todos, até que cruzou com o olhar dos olhos escuros de Thomas – ou Tomie, como ela preferia. Ele estava diferente desde a última vez, o cabelo caia nos olhos e usava roupas mais relaxadas. Mesmo com roupas de moleque, ele estava mais maduro, percebia-se. Seus olhos pareciam cansados, porém encheram-se de alegria e brilho no encontro dos olhares. Ele estava indiscutivelmente irreconhecível. Mas, ao vê-lo, ela sabia: era ele. Com uma beleza diferente, mas bonito como sempre. A tremedeira nas mãos e a ansiedade na barriga confirmavam: era ele.
     Emília andou lentamente ao seu encontro, sem reação. Seus olhos queriam chorar, mas ela sorria. Aquele encontro, aquele momento fez valer os anos que estiveram separados. Seu coração gritava: vamos, corra, só que suas pernas não permitiam, tremiam. O barulho da rodoviária se calou para que os olhares dos apaixonados falassem. Ele estava parado, tão incrédulo e feliz quanto ela. Vendo assim, pareciam duas crianças quando ganham o presente esperado. Ao se aproximar, correu. Correu para o lar que estava procurando: os braços de Thomas. O garoto abraçou forte a menininha, para nunca mais tirarem-na dele. Aquele abraço se eternizou, alguns que passavam paravam para ver e admirar a quantidade de amor que aquele casal transmitia. Ela - com os braços envolvendo seu pescoço - chorava e sorria, com os olhos fechados e todos os pensamentos longe. Chorava e não sabia o porquê. Chorava de felicidade, de saudade, de amor. Chorava pelos anos que aguentou calada, por ter seu sonho e seu plano realizado. Aquele momento, ninguém tiraria dela.

Comentários

  1. Tudo bem, criticas construtivas são sempre boas. Obrigada UHASDHU eu escrevo e não corrijo depois, acho que vou começar a fazer isso :D

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

O tempo não vai esperar você sonhar

Armadilhas